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Abstract
O presente trabalho tem por objetivo revisitar o conceito de voracidade na obra de Melanie Klein, estabelecendo diferenças e relações com o conceito de inveja apresentado pela autora. Tais conceitos serão ilustrados por meio de trechos de duas histórias infantis, “João e Maria” e “Branca de Neve e os sete anões”. Trata-se de uma reflexão que teve como ponto de partida o segundo Seminário teórico/clínico realizado no evento Melanie Klein: inveja e gratidão 60 anos, no qual apresentei um caso clínico que foi comentado por Luiz Tenório Oliveira Lima. A voracidade, de natureza oral, é inerente aos primeiros desejos dirigidos ao objeto. Surge quando os impulsos destrutivos são reforçados, em virtude das privações advindas de fontes internas ou externas (experiências de frustração). A voracidade é uma ânsia impetuosa e insaciável que visa escavar e devorar o objeto. Já a inveja é o sentimento raivoso de que o outro possui algo desejável, sendo o impulso invejoso o de tirar este algo ou de estragá-lo. Apesar de estabelecer diferenças entre os conceitos, Klein (1957) aponta para a existência de uma conexão íntima entre inveja e voracidade. É preciso lembrar que a pessoa demasiadamente invejosa é também insaciável e que a inveja é igualmente dirigida ao primeiro objeto, porém com objetivo de causar estragos. Ambas (voracidade e inveja como corolários dos impulsos destrutivos) podem perturbar a primeira relação com o objeto e dificultar o estabelecimento das identificações mais primordiais e posteriormente o estabelecimento da posição depressiva. Deste modo percebe-se que tanto a inveja quanto a voracidade estão presentes na primeira relação com o objeto e ambas, quando excessivas, prejudicam os processos primários de introjeção, bem como podem dificultar o estabelecimento do bom objeto interno e processos identificatórios. Enquanto a voracidade, em sua ânsia pela nutrição, esvazia o objeto, a inveja, que também pode ser insaciável, causa estragos e o danifica. Ambas são expressões da vida mental arcaica, amplamente trabalhada por Melanie Klein e que servem como importantes operadores do pensamento clínico atual.