{"title":"CONFISSÕES DA MADONNA: A HISTÓRIA DE UMA VÊNUS FEITA ARTE EM WILLENDORF","authors":"Carlos Velázquez, A. C. Alcântara","doi":"10.22533/at.ed.5202218027","DOIUrl":null,"url":null,"abstract":"A revisão de algumas das mais influentes obras no âmbito da História da Arte revela um dado interessante: não há consenso quanto ao significado, pelo menos central, do que, de fato, seria a arte. Dentre formulações à volta de técnicas e utilitários, deslocamentos do problema para as formulações da estética – geralmente declarando a também inexistência de consensos nessa área –, até tentativas de conferir à percepção um status dissociado da cognição e do pensamento abstrato, provavelmente as asserções mais sustentáveis sejam aquelas que gravitam em torno da postura de Ernst Gombrich, quem abriu sua monumental História da Arte declarando não existir na realidade nenhum objeto que possa, propriamente, ser qualificado como arte. Caberia questionar como é que, na ausência de objeto, é possível distinguir um corpo historiográfico específico da arte, ao ponto de reconhecê-lo como área. Entretanto, o interesse que move esta reflexão visa um pouco além, pois procura especular em torno da seguinte hipótese: A inconsistência epistemológica da História da Arte não decorre da ambiguidade conceitual do objeto-arte, mas da própria tentativa de fazer da arte um campo de estudo distinto é independente da complexidade fenomênica da vida humana em correlação com o meio. Enquanto episteme, a História da Arte encontrou suas bases no racionalismo renascentista, em oposição, ao dizer de Pierre Francastel, ao pensamento mítico que caracterizou a antiguidade e retomou lugar durante a – assim chamada – noite medieval. Ora, como o havia também reportado Lévy-Bruhl, essa espécie de misticismo do passado, antes de compelir a qualquer reflexão, concentra seus esforços na adaptação, o que supõe uma intensa interação da espécie com seu meio. Destarte, a fim de evitar abusos retóricos e metafísicos, à maneira de experimentação da hipótese e com apoio em recentes estudos míticos, proponho a observação interpretativa de uma peça cara à historiografia da arte: a Vênus de Willendorf. Este exercício permitirá, por um lado, evidenciar que, apesar da grande recorrência dessa obra nos livros de História da Arte, em inúmeros aspectos ela extravasa as tentativas de definição epistemológica; por outro lado, a interpretação comparativa de sua constituição evidenciará a complexidade articulatória de uma forma de existência menos unilateralmente racionalista e, portanto, muito mais tendente à própria harmonização com o entorno.","PeriodicalId":104150,"journal":{"name":"História e política: Pensamentos constitutivos e críticos 2","volume":"83 1","pages":"0"},"PeriodicalIF":0.0000,"publicationDate":"2022-02-18","publicationTypes":"Journal Article","fieldsOfStudy":null,"isOpenAccess":false,"openAccessPdf":"","citationCount":"0","resultStr":null,"platform":"Semanticscholar","paperid":null,"PeriodicalName":"História e política: Pensamentos constitutivos e críticos 2","FirstCategoryId":"1085","ListUrlMain":"https://doi.org/10.22533/at.ed.5202218027","RegionNum":0,"RegionCategory":null,"ArticlePicture":[],"TitleCN":null,"AbstractTextCN":null,"PMCID":null,"EPubDate":"","PubModel":"","JCR":"","JCRName":"","Score":null,"Total":0}
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Abstract
A revisão de algumas das mais influentes obras no âmbito da História da Arte revela um dado interessante: não há consenso quanto ao significado, pelo menos central, do que, de fato, seria a arte. Dentre formulações à volta de técnicas e utilitários, deslocamentos do problema para as formulações da estética – geralmente declarando a também inexistência de consensos nessa área –, até tentativas de conferir à percepção um status dissociado da cognição e do pensamento abstrato, provavelmente as asserções mais sustentáveis sejam aquelas que gravitam em torno da postura de Ernst Gombrich, quem abriu sua monumental História da Arte declarando não existir na realidade nenhum objeto que possa, propriamente, ser qualificado como arte. Caberia questionar como é que, na ausência de objeto, é possível distinguir um corpo historiográfico específico da arte, ao ponto de reconhecê-lo como área. Entretanto, o interesse que move esta reflexão visa um pouco além, pois procura especular em torno da seguinte hipótese: A inconsistência epistemológica da História da Arte não decorre da ambiguidade conceitual do objeto-arte, mas da própria tentativa de fazer da arte um campo de estudo distinto é independente da complexidade fenomênica da vida humana em correlação com o meio. Enquanto episteme, a História da Arte encontrou suas bases no racionalismo renascentista, em oposição, ao dizer de Pierre Francastel, ao pensamento mítico que caracterizou a antiguidade e retomou lugar durante a – assim chamada – noite medieval. Ora, como o havia também reportado Lévy-Bruhl, essa espécie de misticismo do passado, antes de compelir a qualquer reflexão, concentra seus esforços na adaptação, o que supõe uma intensa interação da espécie com seu meio. Destarte, a fim de evitar abusos retóricos e metafísicos, à maneira de experimentação da hipótese e com apoio em recentes estudos míticos, proponho a observação interpretativa de uma peça cara à historiografia da arte: a Vênus de Willendorf. Este exercício permitirá, por um lado, evidenciar que, apesar da grande recorrência dessa obra nos livros de História da Arte, em inúmeros aspectos ela extravasa as tentativas de definição epistemológica; por outro lado, a interpretação comparativa de sua constituição evidenciará a complexidade articulatória de uma forma de existência menos unilateralmente racionalista e, portanto, muito mais tendente à própria harmonização com o entorno.