Gestão sanitária da COVID-19 e o conspiracionismo do “marxismo cultural”

Ana Paula Andrade Piccini Gomes, Leonardo Carnut
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Esta teoria conspiratória designa um conjunto de estratégias que teriam sido desenvolvidas pela Escola de Frankfurt e por Antonio Gramsci e posta em prática pela esquerda mundial, objetivando a destruição da cultura ocidental. Isto tem sido combinado com sucesso no Brasil com outra teoria: a da “Ameaça comunista no Brasil”, uma crença de que o país está à beira de se converter ao comunismo. A pandemia da COVID-19 fomentou ainda mais o solo fértil de tais teorias conspiratórias. Grupos que creem no “marxismo cultural”, por exemplo, têm propagado um conjunto de argumentos de que sustentam várias teses negacionistas da ciência como o antivacinismo e outras descrenças na ciência relacionadas a tratamentos e imunização de COVID-19 atribuídas a grupos de esquerda ou uma suposta dominação da “esquerda mundial”. Como observado nos últimos anos, tais argumentos têm consequências catastróficas para a saúde pública. Em cartilha da Organização Pan-Americana de Saúde, editada em 2020, o termo aparece sendo suavizado como “infodemia” e “desinformação”, não permitindo a compreensão crítica da urgência em combater esse tipo de narrativa. Segue-se, então, esse clima de ameaça constante onde não se há limites racionais e céticos que permitam uma reflexão razoável sobre o assunto. Toda essa problemática ainda se conjuga com a ascensão do fascismo no contexto complexo da conjuntura econômica e política do capitalismo contemporâneo. As teorias conspiratórias são narrativas extremamente úteis aos fascistas, permitindo assim a manutenção da fascistização social a curto e longo prazo. No Brasil, essas teorias tomaram fôlego através do “marxismo cultural”, em uma guerra cultural anticomunista com argumentos irracionais. Diante da complexidade desta situação, este estudo visa analisar a relação entre os problemas relacionados à gestão sanitária da COVID-19 no mundo com argumentos conspiratórios apresentados pelo “marxismo cultural”. O método escolhido para essa pesquisa foi o da revisão crítica da literatura marxista, a partir da pergunta de pesquisa: “o que a literatura científica apresenta sobre os problemas de gestão sanitária da COVID-19 no mundo e os argumentos conspiratórios apresentados pelo “marxismo cultural”?”. Iniciou-se a revisão através de uma busca exploratória em 70 revistas que publicam conteúdo científico marxista, considerando o período específico da pandemia de 2020 a 2023, através dos termos-livres primários: marxismo cultural (com e sem aspas); Escola de Frankfurt (com e sem aspas); guerra cultural (com e sem aspas); conservadorismo (com e sem aspas) e bolchevismo (com e sem aspas). Após, realizou-se a combinação dos termos-livres primários da busca com termos-livre secundários que foram pensados em função da sua relação com a pergunta de pesquisa com o uso do operador booleano ‘AND’. Foram eles: “pandemia”, “COVID-19” e “Fake News”.Para o processo de seleção do estudo foi utilizado o Fluxograma Prisma. Foram identificados, inicialmente, 1.085 artigos, onde foram excluídos 257 títulos duplicados; na segunda fase foram excluídos 257 publicações por tipo, restando 723 artigos. Desses 723, 614 artigos foram excluídos após a leitura dos títulos utilizando os seguintes marcadores textuais: autoritarismo, antisemitismo, antifascismo, anticomunismo, antivacina, bolsonarismo, Bolsonaro, conservadorismo, conservador, crise sanitária, coronavírus, COVID-19, conspiração, escola sem partido, extrema direita, emergência sanitária, fascismo, fascistização, guerra cultural, hegemonia neoliberal, manipulação midiática, marxismo cultural, neoconservadorismo, neoliberalismo, negacionismo, neofascistas, pandemia, políticas neoliberais, pandemia, polarização, política de isolamento social, populismo, reacionário, reacionarismo, revolução cultural,  SARS-Cov-2 e ultraconservadorismo. Dos 109 artigos restantes, 67 foram excluídos após a leitura dos resumos. Realizou-se, então, a leitura completa de 42 textos, onde foram excluídos 27 artigos que não dialogaram com a pergunta de pesquisa. Foram incluídos nesta revisão o total de 15 artigos. As primeiras análises realizadas demonstraram que todos os artigos relacionam e mencionam a pandemia da COVID-19 e seus desdobramentos econômicos e políticos, através de uma interpretação histórico-crítica. Entretanto, quando analisados nos termos utilizados que podem remeter ao “marxismo cultural”, notamos que os termos presentes são: ‘negacionismo’, ‘Fake News’ e ‘teorias da conspiração’. De quinze artigos, apenas um nomeou como “marxismo cultural” como uma das teorias da conspiração presentes na sociedade. Referente a artigos que citaram a gestão da pandemia, apenas quatro artigos discutiram essa vertente. Praticamente a totalidade dos artigos direciona soluções a longo prazo de combate à estrutura do capitalismo e das suas relações sociais de produção, assim como a atenção à questão climática. Até o momento, o estudo reforçou a ausência de trabalhos que relacionam o “marxismo cultural” e a gestão da pandemia da COVID-19.","PeriodicalId":299004,"journal":{"name":"JMPHC | Journal of Management & Primary Health Care | ISSN 2179-6750","volume":"3 1","pages":"0"},"PeriodicalIF":0.0000,"publicationDate":"2023-08-31","publicationTypes":"Journal Article","fieldsOfStudy":null,"isOpenAccess":false,"openAccessPdf":"","citationCount":"0","resultStr":null,"platform":"Semanticscholar","paperid":null,"PeriodicalName":"JMPHC | Journal of Management & Primary Health Care | ISSN 2179-6750","FirstCategoryId":"1085","ListUrlMain":"https://doi.org/10.14295/jmphc.v15.1324","RegionNum":0,"RegionCategory":null,"ArticlePicture":[],"TitleCN":null,"AbstractTextCN":null,"PMCID":null,"EPubDate":"","PubModel":"","JCR":"","JCRName":"","Score":null,"Total":0}
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Abstract

Não é novidade que as teorias conspiratórias – um conjunto de narrativas que têm como objetivo sustentar uma percepção social e política – compõem o âmago histórico das sociedades humanas. Essas teorias, que ganham voz principalmente em momentos históricos de crise, como podemos observar nos argumentos da “Nova Ordem Mundial”, “Falácia do aquecimento global”, entre outros, já estão consolidados no ideário popular. Dentre esta profusão de teorias da conspiração, uma delas tem sido frequentemente vociferada no mundo e, especialmente no Brasil: o “marxismo cultural”. Esta teoria conspiratória designa um conjunto de estratégias que teriam sido desenvolvidas pela Escola de Frankfurt e por Antonio Gramsci e posta em prática pela esquerda mundial, objetivando a destruição da cultura ocidental. Isto tem sido combinado com sucesso no Brasil com outra teoria: a da “Ameaça comunista no Brasil”, uma crença de que o país está à beira de se converter ao comunismo. A pandemia da COVID-19 fomentou ainda mais o solo fértil de tais teorias conspiratórias. Grupos que creem no “marxismo cultural”, por exemplo, têm propagado um conjunto de argumentos de que sustentam várias teses negacionistas da ciência como o antivacinismo e outras descrenças na ciência relacionadas a tratamentos e imunização de COVID-19 atribuídas a grupos de esquerda ou uma suposta dominação da “esquerda mundial”. Como observado nos últimos anos, tais argumentos têm consequências catastróficas para a saúde pública. Em cartilha da Organização Pan-Americana de Saúde, editada em 2020, o termo aparece sendo suavizado como “infodemia” e “desinformação”, não permitindo a compreensão crítica da urgência em combater esse tipo de narrativa. Segue-se, então, esse clima de ameaça constante onde não se há limites racionais e céticos que permitam uma reflexão razoável sobre o assunto. Toda essa problemática ainda se conjuga com a ascensão do fascismo no contexto complexo da conjuntura econômica e política do capitalismo contemporâneo. As teorias conspiratórias são narrativas extremamente úteis aos fascistas, permitindo assim a manutenção da fascistização social a curto e longo prazo. No Brasil, essas teorias tomaram fôlego através do “marxismo cultural”, em uma guerra cultural anticomunista com argumentos irracionais. Diante da complexidade desta situação, este estudo visa analisar a relação entre os problemas relacionados à gestão sanitária da COVID-19 no mundo com argumentos conspiratórios apresentados pelo “marxismo cultural”. O método escolhido para essa pesquisa foi o da revisão crítica da literatura marxista, a partir da pergunta de pesquisa: “o que a literatura científica apresenta sobre os problemas de gestão sanitária da COVID-19 no mundo e os argumentos conspiratórios apresentados pelo “marxismo cultural”?”. Iniciou-se a revisão através de uma busca exploratória em 70 revistas que publicam conteúdo científico marxista, considerando o período específico da pandemia de 2020 a 2023, através dos termos-livres primários: marxismo cultural (com e sem aspas); Escola de Frankfurt (com e sem aspas); guerra cultural (com e sem aspas); conservadorismo (com e sem aspas) e bolchevismo (com e sem aspas). Após, realizou-se a combinação dos termos-livres primários da busca com termos-livre secundários que foram pensados em função da sua relação com a pergunta de pesquisa com o uso do operador booleano ‘AND’. Foram eles: “pandemia”, “COVID-19” e “Fake News”.Para o processo de seleção do estudo foi utilizado o Fluxograma Prisma. Foram identificados, inicialmente, 1.085 artigos, onde foram excluídos 257 títulos duplicados; na segunda fase foram excluídos 257 publicações por tipo, restando 723 artigos. Desses 723, 614 artigos foram excluídos após a leitura dos títulos utilizando os seguintes marcadores textuais: autoritarismo, antisemitismo, antifascismo, anticomunismo, antivacina, bolsonarismo, Bolsonaro, conservadorismo, conservador, crise sanitária, coronavírus, COVID-19, conspiração, escola sem partido, extrema direita, emergência sanitária, fascismo, fascistização, guerra cultural, hegemonia neoliberal, manipulação midiática, marxismo cultural, neoconservadorismo, neoliberalismo, negacionismo, neofascistas, pandemia, políticas neoliberais, pandemia, polarização, política de isolamento social, populismo, reacionário, reacionarismo, revolução cultural,  SARS-Cov-2 e ultraconservadorismo. Dos 109 artigos restantes, 67 foram excluídos após a leitura dos resumos. Realizou-se, então, a leitura completa de 42 textos, onde foram excluídos 27 artigos que não dialogaram com a pergunta de pesquisa. Foram incluídos nesta revisão o total de 15 artigos. As primeiras análises realizadas demonstraram que todos os artigos relacionam e mencionam a pandemia da COVID-19 e seus desdobramentos econômicos e políticos, através de uma interpretação histórico-crítica. Entretanto, quando analisados nos termos utilizados que podem remeter ao “marxismo cultural”, notamos que os termos presentes são: ‘negacionismo’, ‘Fake News’ e ‘teorias da conspiração’. De quinze artigos, apenas um nomeou como “marxismo cultural” como uma das teorias da conspiração presentes na sociedade. Referente a artigos que citaram a gestão da pandemia, apenas quatro artigos discutiram essa vertente. Praticamente a totalidade dos artigos direciona soluções a longo prazo de combate à estrutura do capitalismo e das suas relações sociais de produção, assim como a atenção à questão climática. Até o momento, o estudo reforçou a ausência de trabalhos que relacionam o “marxismo cultural” e a gestão da pandemia da COVID-19.
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COVID-19卫生管理与“文化马克思主义”阴谋论
阴谋论——一套旨在维持社会和政治感知的叙事——构成了人类社会的历史核心,这并不新鲜。这些理论主要在历史危机时刻发出声音,我们可以在“世界新秩序”、“全球变暖谬论”等论点中看到,它们已经在大众意识形态中得到巩固。在众多的阴谋论中,有一种理论在世界上,尤其是在巴西,经常被大声疾呼:“文化马克思主义”。这个阴谋论指的是法兰克福学派和安东尼奥·葛兰西(Antonio Gramsci)制定的一套策略,由世界左派实施,旨在摧毁西方文化。在巴西,这与另一种理论成功地结合在一起:“巴西的共产主义威胁”,一种认为这个国家正处于向共产主义转变的边缘的信念。COVID-19大流行进一步助长了这种阴谋论的沃土。例如,相信“文化马克思主义”的团体传播了一套论点,支持各种否定科学的论点,如反反主义和其他对COVID-19治疗和免疫科学的怀疑,归因于左翼团体或所谓的“世界左翼”统治。正如近年来所观察到的,这种论点对公共卫生造成了灾难性的后果。在泛美卫生组织2020年出版的小册子中,这个词似乎被淡化为“信息传播”和“虚假信息”,不允许批判性地理解打击这类叙述的紧迫性。随之而来的是一种持续的威胁气氛,在这种气氛中,没有理性和怀疑的限制,允许对这一问题进行合理的反思。在当代资本主义复杂的经济和政治背景下,所有这些问题仍然与法西斯主义的兴起有关。阴谋论对法西斯主义者来说是非常有用的叙事,因此允许社会法西斯主义在短期和长期内维持。在巴西,这些理论通过“文化马克思主义”在一场带有非理性论点的反共文化战争中得到了复兴。鉴于这一形势的复杂性,本研究旨在分析全球COVID-19卫生管理相关问题与“文化马克思主义”提出的阴谋论之间的关系。本研究选择的方法是对马克思主义文献进行批判性回顾,从研究问题“关于COVID-19卫生管理问题的科学文献和“文化马克思主义”提出的阴谋论提出了什么?”本文首先对70种发表马克思主义科学内容的期刊进行探索性搜索,考虑到2020年至2023年大流行的特定时期,通过主要自由术语:文化马克思主义(带引号和不带引号);法兰克福学校(带引号和不带引号);文化战争(有引号和没有引号);保守主义(有或没有引号)和布尔什维克主义(有或没有引号)。在此之后,我们使用布尔运算符' AND '将主要搜索项与次要搜索项结合起来,根据它们与搜索问题的关系来考虑次要搜索项。它们是:“大流行”、“COVID-19”和“假新闻”。在研究的选择过程中,使用了棱镜流程图。初步确定了1085篇文章,排除了257篇重复标题;在第二阶段,按类型排除了257篇出版物,剩下723篇文章。在这723篇文章中,614篇在使用以下文本标记阅读标题后被删除:独裁主义、反犹太主义、反法西斯,反共,antivacina bolsonarismo Bolsonaro,保守主义,保守的健康危机,冠状病毒,COVID -19,阴谋,学校没有,右翼政党,卫生紧急状态,是法西斯fascistização,文化战争,新自由主义,霸权主义操纵媒体文化,马克思主义、新保守主义、新自由主义,否认犹太人,新法西斯病,病的新自由主义政策,两极分化,社会的孤立政策,民粹主义、反动主义、反动主义、文化大革命、SARS-Cov-2和极端保守主义。在剩下的109篇文章中,67篇在阅读摘要后被删除。然后对42篇文章进行了完整的阅读,其中27篇文章没有与研究问题进行对话。本综述共纳入15篇文章。第一次分析表明,所有文章都通过历史批判的解释,涉及并提到COVID-19大流行及其经济和政治后果。
本文章由计算机程序翻译,如有差异,请以英文原文为准。
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Gestão sanitária da COVID-19 e o conspiracionismo do “marxismo cultural” Alocação de recursos públicos para os sistemas de laboratórios de análises clínicas no SUS Revisão sistemática integrativa sobre os fenômenos de privatização e oligopolização do setor de terapia renal substitutiva no capitalismo contemporâneo Insegurança alimentar e nutricional no Brasil Implementação de modelos de compartilhamento de risco (risk sharing) no acesso ao tratamento de doenças raras no brasil e no mundo
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