{"title":"Hagiografia de uma cortesã: idílio, modo romanesco e legenda em Lucíola, de José de Alencar","authors":"M. Peres","doi":"10.1590/2596-304x20232548mfp","DOIUrl":null,"url":null,"abstract":"RESUMO Desde seu lançamento, Lucíola (1862) tem sido objeto de análises que abordam especialmente o paralelo com a A dama das camélias (Alexandre Dumas Filho) e Paulo e Virgínia (Bernardin de St-Pierre). Porém, raramente as questões ali presentes foram tratadas em seu conjunto, de modo a constituírem uma narrativa única e coerente. Pois, a despeito da linguagem erótica dos capítulos iniciais, as imagens idílicas ou “analogia da inocência” (Frye) acabam por sobrepor-se gradualmente na construção de cenas, diálogos e situações, assim como nas remissões à obra de St. Pierre, a Atala (Chateaubriand) e aos idílios de Teócrito. Assim, Lucíola sofre uma modificação crucial em seu mythos, que passa a orbitar em torno do conceito de idílio, não apenas enquanto locus amoenus (Curtius) mas sobretudo no sentido moderno atribuído a ele por Schiller (1800), segundo o qual trata-se de um vir-a-ser que só se realiza plenamente na chave da transcendência. Tal reorientação, da imanência à transcendência, aproxima-o de uma das chamadas “formas simples” (Jolles), que é a legenda cristã. Ao objetificar bem e mal, a legenda culmina na personagem qualitativamente superior do santo, cujos mythos se dão através do “trajeto que conduz à santidade” (Jolles). Discutindo tais premissas teóricas, o artigo propõe que a crítica a Lucíola revelou profunda incompreensão quanto ao papel discursivo de G.M., a digna senhora responsável por publicar as cartas a ela entregues por Paulo, o amante da heroína. G.M. compreende a construção do romance enquanto vita e exemplum - algo que o narrador não chega a entender.","PeriodicalId":33855,"journal":{"name":"Revista Brasileira de Literatura Comparada","volume":"8 3 1","pages":""},"PeriodicalIF":0.0000,"publicationDate":"2023-04-01","publicationTypes":"Journal Article","fieldsOfStudy":null,"isOpenAccess":false,"openAccessPdf":"","citationCount":"1","resultStr":null,"platform":"Semanticscholar","paperid":null,"PeriodicalName":"Revista Brasileira de Literatura Comparada","FirstCategoryId":"1085","ListUrlMain":"https://doi.org/10.1590/2596-304x20232548mfp","RegionNum":0,"RegionCategory":null,"ArticlePicture":[],"TitleCN":null,"AbstractTextCN":null,"PMCID":null,"EPubDate":"","PubModel":"","JCR":"","JCRName":"","Score":null,"Total":0}
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Abstract
RESUMO Desde seu lançamento, Lucíola (1862) tem sido objeto de análises que abordam especialmente o paralelo com a A dama das camélias (Alexandre Dumas Filho) e Paulo e Virgínia (Bernardin de St-Pierre). Porém, raramente as questões ali presentes foram tratadas em seu conjunto, de modo a constituírem uma narrativa única e coerente. Pois, a despeito da linguagem erótica dos capítulos iniciais, as imagens idílicas ou “analogia da inocência” (Frye) acabam por sobrepor-se gradualmente na construção de cenas, diálogos e situações, assim como nas remissões à obra de St. Pierre, a Atala (Chateaubriand) e aos idílios de Teócrito. Assim, Lucíola sofre uma modificação crucial em seu mythos, que passa a orbitar em torno do conceito de idílio, não apenas enquanto locus amoenus (Curtius) mas sobretudo no sentido moderno atribuído a ele por Schiller (1800), segundo o qual trata-se de um vir-a-ser que só se realiza plenamente na chave da transcendência. Tal reorientação, da imanência à transcendência, aproxima-o de uma das chamadas “formas simples” (Jolles), que é a legenda cristã. Ao objetificar bem e mal, a legenda culmina na personagem qualitativamente superior do santo, cujos mythos se dão através do “trajeto que conduz à santidade” (Jolles). Discutindo tais premissas teóricas, o artigo propõe que a crítica a Lucíola revelou profunda incompreensão quanto ao papel discursivo de G.M., a digna senhora responsável por publicar as cartas a ela entregues por Paulo, o amante da heroína. G.M. compreende a construção do romance enquanto vita e exemplum - algo que o narrador não chega a entender.